Luta contra a repressão
Com o reinício das aulas do ano lectivo de 1972, assistiu-se a um recrudescimento da violência repressiva nas universidades pelo governo ditatorial de Marcelo Caetano e Veiga Simão, com o objectivo de tentar desesperadamente conter o despertar da consciência política revolucionária da juventude estudantil. No Instituto Superior Técnico e em Económicas, os estudantes mantinham-se em greve em resposta a brutais cargas policiais desencadeadas naquelas Escolas.
Refira-se que, por essa altura, fora montada no ministério da Educação Nacional uma estrutura designada Centro de Documentação e Informação (CDI), que "funcionou como um centro de recolha documental, como estrutura de financiamento de organizações de extrema-direita e como aparelho de retaguarda para uma mais eficaz repressão governativa", dirigido pelo subsecretário de Estado da Juventude e Desportos, Elmano Alves, e a que estavam ligados, designadamente, o tenente-coronel José Luís Ferreira da Cunha, o capitão de fragata Adriano Coutinho Lanhoso, o major Augusto Azevedo Batalha e o diretor de serviços da PIDE/DGS Álvaro Pereira de Carvalho.
Foi também o CDI que recrutou e instruiu um corpo de vigilantes, os "gorilas", seguranças colocados às portas das faculdades para impedir a entrada de estudantes "indesejáveis", composto fundamentalmente por ex-comandos. Aquele verdadeiro centro pidesco agia em estreita ligação com a PIDE/DGS e a Legião Portuguesa, visando, em especial, a perseguição dos estudantes com atividade associativa e política, tendo tido também intervenção direta na homologação das direções das estruturas associativas académicas.
Convocatória do meeting contra a repressão
Não baixando os braços, estudantes de várias faculdades de Lisboa convocaram para o dia 12 de outubro de 1972, num anfiteatro do Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF) e atual ISEG (mais conhecido pelos estudantes por “Económicas”), um "meeting" contra a repressão e o imperialismo, dando continuidade às lutas travadas em conjunto com os colegas das universidades de Coimbra e do Porto.
Aproximando-se a hora da reunião, Ribeiro Santos, depois de passar por casa de uma estudante amiga que se encontrava doente, dirigiu-se sem demora para Económicas com vários colegas.
Provocações e contactos com a PIDE/DGS
Pouco antes do início da reunião, alguns estudantes interpelaram um indivíduo estranho no interior da Escola, surpreendido a apontar as palavras de ordem que estavam afixadas nas paredes. As respostas incoerentes ao que ali fazia, bem como a ausência de identificação, geraram a suspeita de se tratar de um informador da Direção Geral de Segurança (DGS), o novo nome da velha PIDE - o que o próprio confirmou.
Tratava-se, na verdade, do guarda n.º 2462/22621, da Secção de Informações- 4.ª Divisão da PSP, de nome Vitor Lopes Manuel. Cercado pelos estudantes, foi imediatamente levado para a frente do anfiteatro, junto ao quadro preto e aí encapuçado com um saco, para não poder reconhecer e identificar os estudantes presentes.
Entretanto, elementos da Direção da Associação de Estudantes da Escola anfitriã, após um contacto com o Secretário do ISCEF (João Manuel Calçadas Estrela, secretário-chefe da Secção Administrativa), têm a inadmissível e bizarra ideia de aceitar a deslocação ao local de agentes da própria polícia política para identificação do desconhecido retido pelos estudantes.
É assim que esse Secretário-chefe do ISCEF e elementos da Direção da Associação de Estudantes contactam telefonicamente a PIDE/DGS, onde são atendidos pelo inspetor Dias de Melo, solicitando "a imediata comparência de alguém que pudesse reconhecer e identificar o indivíduo" que "afirmara ser agente da Direcção-Geral de Segurança".
A posterior entrada provocatória dos esbirros da DGS, docilmente acompanhados por três dirigentes da associação académica, num anfiteatro a abarrotar, provocou a indignação generalizada dos presentes perante aquela situação de inconcebível cumplicidade (gritava-se: “Assassinos! Rua!”).
Logo avançou para os expulsar da Escola um grupo de estudantes encabeçado por Ribeiro Santos, interpondo-se-lhes nesse momento aqueles dirigentes associativos a travar-lhes o passo e a gritar: "Calma, calma, que nós temos garantias!".
Foi o tempo suficiente para um dos esbirros que para ali fora destacado, na sequência do telefonema do secretário do ISCEF - o agente de 2.ª classe da PIDE/DGS António Joaquim Gomes da Rocha – sacar da sua pistola e disparar, atingindo Ribeiro Santos pelas costas que tombou, logo amparado por colegas. Mas esse pide continuou a disparar - só a intervenção de José Lamego, que o agarrou, impediu que ele continuasse, embora atingindo este numa coxa.
Aproveitando a confusão que se instalou, este agente da PIDE/DGS fugiu, de arma na mão e dizendo-se apedrejado, acabando por se refugiar, com o bufo inicialmente denunciado, na 30.ª esquadra (Caminho Novo) ali perto (e que já não existe). O outro pide já se tinha escapado - após ter informado os seus superiores pelo telefone, a partir do gabinete do secretário do Instituto..
Imediatamente transportado para o Hospital de Santa Maria por estudantes de Medicina que se encontravam na reunião, José António Ribeiro Santos vem a morrer ainda na Sala de Observações.